A conjuntura histórica do centro-medievo foi marcada por intensas transformações na vida social do ocidente europeu. Uma destas significativas mudanças, operada nas regiões das atuais França e Inglaterra, foi a emergência do que se chamou de roman, um tipo de escrito em língua românica que versava sobre os mais variados temas da existência humana. Temas que abrangiam desde conteúdos mitológicos da chamada Antiguidade clássica, como das regiões que hoje conhecemos como Grã-Bretanha. Ao compor o que ficou conhecido como Matéria da Bretanha, a ressurgência do mito de Tristão e Isolda possivelmente galês em seu âmago no contexto anglo-normando da dinastia angevina de Henrique II, Plantageneta (meados do século XII), é um importante indício que nos auxilia a compreender as lógicas de interações, sociais, culturais e econômicas, da sociedade dita feudal. Os percursos narrativos do Roman de Tristan uma das versões da legenda, elaborada por um poeta chamado Thomas, na segunda metade do século XII ajudam-nos a entender aspectos essenciais da sociedade cortês centro-medieval; aspectos que, por sua vez, permitem-nos vislumbrar as construções das identidades e das relações de gêneros que subjazem, em alguma medida, na sociedade em que o poema foi elaborado. A partir, portanto, da identificação de elementos próprios da historicidade do roman como a difusão e persistência de elementos da cavalaria, as discussões canônicas cristãs sobre os comportamentos sexuais e a arquitetura retórica da fonte , juntamente ao levantamento panorâmico, mas preciso, de questões contextuais fundamentais, buscaremos identificar os modos de construção e desenvolvimento das relações e identidades de gêneros que se delinearam na narrativa. Desenvolvimentos que podem, em alguma medida, nos revelar aspectos importantes sobre a relação binária que angaria a feminilidade e a masculinidade como pares opostos em curso no ocidente cristão e que permanece, em grande parte, no imaginário ocidental até os dias de hoje

The historical conjuncture of the middle-medieval period was highlighted by intense transformations in the social life of Western Europe. One of these significant changes, which took place in the regions of present-day France and England, was the emergence of what was called roman, a type of writing in Romance that dealt with a varied range of themes concerning human existence. Themes that embraced mythological contents of the so-called classical Antiquity to the regions that are known today as Great Britain. In composing what has become titled as the Matter of Brittany, the resurgence of the myth of Tristan and Iseult possibly Welsh at its core in the Anglo-Norman context of Henry II's Angevin dynasty, Plantagenet (mid-twelfth century), is an important clue, which helps us to understand the logic of social, cultural, and economic interactions, of the so-called feudal society. The narrative paths of the Roman de Tristan one of the versions of the legend, created by a poet named Thomas, in the second half of the twelfth century assists in our understanding of essential aspects of central-medieval court society; aspects that allows us to have a glimpse of the constructions of identities and gender relations that underlie, in certain way, the society in which the poem was written. Based, therefore, on the identification of specific elements of the historicity of the roman such as the diffusion and persistence of elements of chivalry, the Christian canonical discussions on sexual behaviours and the rhetorical architecture of the source , along with a panoramic, but accurate, survey of fundamental contextual issues, we will seek to identify the modes of construction and development of gender relations and identities that were outlined in the narrative. Developments that can reveal to us important aspects about the binary relationship which sustains femininity and masculinity as opposite pairs in course throughout the Christian West and which remains, in many ways, in the Western imaginary to the present day