As dinâmicas das identidades e religiosidades em uma comunidade remanescente de quilombo conformam a tônica da presente tese. O campo empírico é o Quilombo do Carmo, localizado em São Roque/SP, a partir do qual será analisada, no primeiro capítulo, a organização do tempo pela religiosidade, com ponderações sobre catolicismo popular, significados e sentidos de celebrações religiosas a partir do calendário devocional vivido. No segundo capítulo será tratada a religiosidade em sua interface à constituição social da comunidade, estabelecendo as reflexões pelas estruturas simbólicas do/no mito de origem e os modos pelos quais atributos religiosos assentam-se em relações de parentesco e de afinidade. O capítulo terceiro reflexiona acerca da constituição sociocultural do território e do papel da religiosidade nos processos de territorialização, desterritorialização e reterritorialização que marcam a trajetória da comunidade, caracterizando a produção social de uma territorialidade por atividades religiosas que designam a configuração de espacialidades devocionais. A questão quilombola é introduzida no quarto capítulo, agregando enunciados das teorias das identidades, etnicidades, direitos de minorias, atentando aos paradoxos dos processos de reconhecimentos de direitos de base étnica e aos modos pelos quais intercorreram a etnogênese quilombola dentre o povo do Carmo. À vista disso, a tese é metaforizada a uma colcha de retalhos, artefato expressivo da comunidade, tendo em cada capítulo um retalho cujo tema é basilar à compreensão das dinâmicas identitárias que aqui se costuram pela religiosidade. Noutros termos, encalço os modos pelos quais a lógica da religiosidade, de modo geral, organiza a temporalidade, a parentalidade, a territorialidade e a etnicidade; e como Nossa Senhora do Carmo, de modo particular, norteia a constituição da identidade do grupo enquanto etnicamente singularizado. No tropo da roda de fiar da vida social, o tear segue a urdir aos modos pelos quais a santa-mãe-padroeira é tanto o eixo da origem da comunidade quanto da sua permanência naquela área. No fuso, a compreensão dos processos de construção de uma identidade e de uma territorialidade quilombolas que terão seus alicerces no que já era o componente motívico da existência e da permanência do grupo social: Nossa Senhora do Carmo. A colcha-tese tece, portanto, a religiosidade como um sistema cultural, a estruturar a organização social, a construir sociabilidades e solidariedades, reciprocidades e obrigações, numa racionalidade que vai entrelaçar também os direitos e o estado quando principia a questão quilombola. Assim sendo, pontuo as narrativas e ações que vão conduzir a etnogênese quilombola segundo os critérios de pertencimento do grupo e, nessa trama identitária, a santa-mãe-padroeira se torna a bandeira de luta dos filhos, devotos, herdeiros e quilombolas de Nossa Senhora do Carmo, conciliando as generalidades da lei aos seus dísticos de pertença em um processamento que tem o condão de fiar o pluralismo jurídico. Palavras-chave:

The dynamics of identities and religiosities in a quilombola community form the keynote of this thesis.The empirical field is Quilombo do Carmo, located in São Roque/SP, from which, in the first chapter, the organization of time by religiosity will be analyzed, with considerations on popular Catholicism, meanings and senses of religious celebrations from the calendar devotional lived. In the second chapter, religiosity will be dealt with in its interface to the social constitution of the community, establishing reflections on the symbolic structures of/in the myth of origin and the ways in which religious attributes are based on kinship and affinity relationships. The third chapter reflects on the sociocultural constitution of the territory and the role of religiosity in the processes of territorialization, deterritorialization and reterritorialization that mark the trajectory of the community, characterizing the social production of a territoriality by religious activities that designate the configuration of devotional spaces. The quilombola issue is introduced in the fourth chapter, adding statements from the theories of identities, ethnicities, and minority rights, paying attention to the paradoxes of the processes of recognition of ethnic rights and the ways in which the quilombola ethnogenesis took place within the Carmo community. In view of this, the thesis is metaphorized to a patchwork quilt, an expressive artifact of the community, having in each chapter a patch whose theme is fundamental to the understanding of the identity dynamics that are sewn by religiosity. In other words, I follow the ways in which the logic of religiosity, in general, organizes temporality, kinship, territoriality and ethnicity; and how Nossa Senhora do Carmo, in particular, guides the constitution of the group's identity as ethnically singular. In the trope of the spinning wheel of social life, the loom continues to weave the ways in which the saint-mother-patron is both the axis of the origin of the community and of its permanence in that area. In the spindle, the understanding of the processes of construction of a quilombola identity and a quilombola territoriality that will have their foundations in what was already the motivic component of the existence and permanence of the social group: Nossa Senhora do Carmo. The thesis quilt weaves religiosity as a cultural system, structuring social organization, building sociabilities and solidarities, reciprocity and obligations, in a rationality that will also intertwine rights and the state when the quilombola issue begins. Therefore, I point out the narratives and actions that will lead to quilombola ethnogenesis according to the criteria of belonging to the group and, in this identity plot, the saint-mother-patron becomes the flag of struggle of the children, devotees, heirs and quilombolas of Nossa Senhora do Carmo, reconciling the generalities of the law with its couplets of belonging in a process that has the power to build a legal pluralism.