A principal motivação deste trabalho é o desejo da compreensão. Consiste em uma investigação sobre o fenômeno da autoridade no campo formativo teatral a partir de uma perspectiva institucional, recorrendo, para tanto, à abordagem teórico-filosófica de Hannah Arendt e Myriam Revault dAllonnes. A investigação inicia com uma imersão exploratória em textos acadêmicos que versam sobre autoridade pedagógica no campo do teatro e, posteriormente, no campo da pesquisa educacional. Na esteira de procedimentos inspirados na pesquisa arquivística aplicada à educação, a análise do material evidencia que, no geral, os discursos da pedagogia do teatro no Brasil se apresentam combativos à ideia de autoridade, por tomarem o termo como sinônimo de poder e coerção. Contudo, Hannah Arendt alerta que autoridade diz respeito à confiança e a uma legitimidade pré-adquirida. Myriam Revault dAllonnes enriquece essa perspectiva por meio de uma análise fenomenológica da autoridade, relacionando-a com a durabilidade de um ato fundador coletivo visando à criação de sentido intergeracional. Um olhar historicamente mais amplo revela que o campo formativo teatral se estrutura por meio de tradições pedagógicas, porém, tradições vivas, uma dialética entre conhecimentos instituídos e novas formas de trabalho sobre esses mesmos princípios geradores. Essa temporalidade não linear das tradições pedagógicas dialoga com a noção de autoridade do tempo de Revault dAllonnes, apresentando uma faceta inesperada para os discursos vigentes sobre autoridade na pedagogia do teatro: a autoridade é o substrato pelo qual o campo formativo teatral se estrutura. Por fim, a pesquisa examina as experiências de duas instituições formativas: o Centro de Pesquisa Teatral (CPT) e a Escola Livre de Teatro de Santo André (ELT). Por intermédio da análise de um vasto arquivo de materiais, o estudo se dedicou a compreender a maneira como cada uma dessas instituições estabelece uma relação com a tradição e manifesta a autoridade docente. As noções de mestre artista e mestre orientador são evocadas para demarcar os modelos de autoridade implicados. Além disso, ao mergulhar na maneira como a autoridade docente se manifesta em cada escola, emergem reflexões significativas para a prática formativa teatral, resvalando em temas altamente relevantes, como o exercício do poder na relação pedagógica, abordagens potencialmente violentas na formação artística, práticas de assédio e abuso nas artes cênicas, indisciplina e colaboração no âmbito do teatro, bem como a problemática das tensões geracionais implicadas na formação teatral, especialmente relacionadas às questões de raça, gênero e classe social, que ganham destaque no debate público nos últimos anos. A ênfase na natureza institucional da autoridade pedagógica destaca que ela não pode ser concebida desvinculada do contexto que governa a relação educacional, de modo que a autoridade que a pessoa docente encarna é sempre impactada pelas circunstâncias institucionais nas quais as relações humanas implicadas se estabelecem. Ademais, a perspectiva proposta realça a crescente complexidade que envolve a autoridade docente na contemporaneidade, que ganha nuances adicionais e requer uma reavaliação à luz de preocupações atuais.

The chief motivation for this work is the desire for understanding. It consists of an investigation into the phenomenon of authority in the theatrical training field from an institutional perspective, employing the theoretical-philosophical approaches of Hannah Arendt and Myriam Revault dAllonnes. The investigation begins with an exploratory immersion into academic texts that deal with pedagogical authority within theater and, later, within educational research. Following procedures inspired by archival research applied to education, the analysis of the material shows that, in general, discourses of theater pedagogy in Brazil appear to confront the idea of authority, taking the term as a synonym for power and coercion. However, Hannah Arendt warns that authority concerns trust and pre-acquired legitimacy. Myriam Revault dAllonnes enriches this perspective through a phenomenological analysis of authority, relating it to the durability of a collective founding act aimed at creating intergenerational meaning. A broader historical look reveals that the theater training field is structured through pedagogical traditions that are, nevertheless, living traditions, in a dialectical gesture between established knowledge and new forms of work on these same generating principles. This nonlinear temporality of pedagogical traditions dialogues with Revault dAllonnes notion of authority of time, presenting an unexpected facet to the current discourses on authority in theater pedagogy: authority is the substrate on which the theatrical training field is built. Finally, the research examines the experiences of two training centers: the Centro de Pesquisas Teatrais (CPT, or Center for Theater Research) and the Escola Livre de Teatro de Santo André (ELT, or Santo André Open Theater School). Analyzing a vast archive of materials, the study interprets how each institution establishes a relationship with tradition and conceives of teacher authority. The notions of master artist and master advisor are evoked to delineate the models of authority involved. Furthermore, when observing how teaching authority manifests in each school, significant reflections emerge for theatrical training practice, delving into highly relevant themes, such as the exercise of power in the pedagogical relationship, the potentially violent approaches in artistic training, the practices of harassment and abuse in the performing arts, or the topics of indiscipline and collaboration within the theater world; and generational tensions involved in theatrical training, especially related to issues of race, gender and social class, which gained prominence in public debate in the last years. The emphasis on the institutional nature of pedagogical authority highlights that it cannot be conceived separately from the context that governs the educational relationship: the authority embodied by the teaching person is always impacted by the institutional circumstances in which those human relationships are established. Moreover, this perspective highlights the growing complexity around teaching authority in contemporary times, which gains additional nuances and requires a reassessment in light of current concerns.