Introdução e justificativas: a dissociação pode estar envolvida nas experiências mediúnicas, serem culturalmente compartilhadas, compreendidas e dotadas de sentido. As pesquisas têm investigado experiências mediúnicas e dissociativas em adultos, sendo expressivos os relatos retrospectivos das primeiras vivências mediúnicas na infância. Objetivos: revisar a literatura nacional e estrangeira sobre as experiências de dissociação e de mediunidade na infância. Adicionalmente, levantar as implicações das experiências dissociativas e mediúnicas na infância para a saúde mental; verificar o papel da cultura e do contexto nas experiências mediúnicas e dissociativas; e, de forma complementar, traduzir e adaptar para o português brasileiro a Escala Child Dissociative Checklist, versão 3. Método: revisão de literatura, tradução e adaptação da Escala. Resultados e discussão: os achados foram considerados em suas especificidades, mas discutidos sempre à luz da perspectiva psicossocial. Eles sugerem principalmente que: (1) em crianças, à semelhança de adultos, as experiências dissociativas podem estar implicadas na mediunidade e serem um modo de vivenciá-la; (2) a hipótese etiológica mais sustentada sobre a dissociação e a mediunidade na infância é a do trauma, associada a um viés patológico, o qual questionamos; (3) a perspectiva psicossocial, evidente em estudos mais recentes, sem negar a hipótese do trauma, outras etiologias possíveis e aspectos da subjetividade, salienta a relevância do contexto e da cultura, seja como estimuladores ou como mediadores na ocorrência e desenvolvimento das experiências dissociativas e mediúnicas na infância; (4) em relação a adultos, crianças tendem a dissociar mais facilmente, apresentam maiores índices de propensão à fantasia, absorção, envolvimento imaginativo, fluidez em processos cognitivos e atencionais; (5) sobre a mediunidade na infância, apenas foram encontradas pesquisas com o termo "possessão espiritual", que é fenomenologicamente semelhante à mediunidade nas manifestações, sendo um termo empregado de acordo com a cultura onde ocorre a experiência e a perspectiva do pesquisador; (6) em crianças, experiências dissociativas e de possessão, na relação com o contexto, podem atuar na constituição da identidade, auxiliar no enfrentamento de adversidades, na busca por sentido e significado, promoverem bem estar, crescimento pessoal ou, pelo contrário, sofrimento; (7) concluído o procedimento com a Escala, revela-se um importante instrumento para gerar estudos futuros sobre esses temas no Brasil e, apesar dos vieses, há um debate em aberto sobre a relação entre dissociação tendencial e contextual; (8) poucas são as pesquisas sobre dissociação e mediunidade na infância, sendo um campo fértil para estudo e que requer adequações e cuidados metodológicos no estudo das crianças

Introduction and rationale: dissociation may be involved in mediumistic experiences, be culturally shared, understood, and endowed with meaning. Previous research has investigated dissociative and mediumistic experiences in adults. Acording to them, it's expressive the retrospective reports of the first mediumistic experiences in childhood. Objectives: this study aims to review national and foreign literature on dissociation and mediumship experiences in childhood. Additionally, it aims to explore the implications of dissociative and mediumistic experiences in childhood for mental health; to verify the role of culture and context in mediumistic and dissociative experiences; and, complementarily, translate and adapt to Brazilian Portuguese the Child Dissociative Checklist, version 3. Method: literature review, translation and adaptation of the Scale. Results and discussion: the findings were considered in their specificities, but always discussed in the light of the psychosocial perspective. They mainly suggest that: (1) in children, like adults, dissociative experiences may be implicated in mediumship and the second may be a way of experiencing the first; (2) the most sustained etiological hypothesis about dissociation and mediumship in childhood is that of trauma, associated with a pathological bias, which is questioned here; (3) the psychosocial perspective, evident in more recent studies, without negating the hypothesis of trauma, other possible etiologies and aspects of subjectivity, underlines the relevance of context and culture, either as stimulators or as mediators in the occurrence and development of dissociative experiences and mediumistic in childhood; (4) in relation to adults, children tend to dissociate more easily, have higher rates of fantasy proneness, absorption, imaginative involvement, fluidity in cognitive and attentional processes; (5) with regard to mediumship in childhood, there were only found researches with the term "spiritual possession", that is phenomenologically similar to mediumship regarding the manifestations, which is a term used according to the culture where it occurs and the researcher's perspective; (6) in children, dissociative and spiritual possession experiences, in relation to the context, can act in the constitution of identity, help on coping with adversity, in the search for meaning, promote well-being, personal growth or, on the other hand, suffering; (7) once the procedure is concluded with the Scale, it is noted that the instrument is important to generate future studies on these themes in Brazil, and despite the biases, there is an open debate about the relationship between trend and contextual dissociation; (8) there is little research on dissociation and mediumship in childhood, and this is a fertile field for study which requires methodological care in the study of children