Esta pesquisa examina os fundamentos e o sentido de direitos à privacidade em face do Estado - mais particularmente, de seus interesses na promoção da segurança da população, a propósito de reflexões e mudanças provocadas pelo avanço tecnológico. Tem como objetivo defender e demonstrar que o modo como enfrentamos questões sobre o escopo desses direitos e a existência ou não de violação deles tem muito a se beneficiar de uma abordagem interpretativa - atenta à nuance dada por contextos, que não planifica o sentido de direitos equivalendo-os a interesses nem pressupõe uma rivalidade entre privacidade e segurança antes de depurar o sentido desses valores. A partir disso, ofereço um modelo sobre como pensar direitos à privacidade em face do Estado nesse campo - como identifica-los e como compreender a que propósito servem - e resgato o sentido da noção de segurança e os limites do que consegue justificar em termos de medidas estatais. Essa leitura reafirma uma noção central para a justificação do uso da força estatal nos campos de interação entre segurança e privacidade: o respeito a regras e procedimentos assentados em decisões coletivas de uma comunidade política que acomodem direitos morais contra abusos, erros e excessos, inspirados em compromissos de princípio que só admitem interferências em prerrogativas de privacidade quando razões específicas concretas o justifiquem - notadamente suspeita individualizada ou perigo concreto e iminente. Essas noções se perdem quando simplesmente se pressupõe que interesses públicos superam interesses privados ou que um teste de proporcionalidade serviria para balizar condutas estatais nessa intersecção. A seguir, o trabalho apresenta um panorama histórico das proteções jurídicas constitucionais de privacidades no Brasil e reconstrói a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) em casos sobre privacidade e como concebe os limites do Estado sobre as "inviolabilidades" da vida privada, da intimidade, do domicílio e do sigilo de comunicações. Mostra como entendimentos se firmaram e como paradigmas de privacidade da Constituição Federal e da jurisprudência constitucional se alinham e se distanciam da tese apresentada sobre o que significa preservar direitos à privacidade em face do Estado. O diagnóstico é que estão amplamente fragilizados e desorientados especialmente em novas áreas de atuação ligadas ao avanço tecnológico, como o "sigilo telemático". Diante disso, o trabalho mostra como a retórica alarmista contra privacidade no campo do combate ao crime é frágil, oferece um ferramental regulatório para lidar com questões de privacidade e propõe encaminhamentos para o enfrentamento de questões concretas do campo "digital", para a identificação de limites e para o redirecionamento da jurisprudência constitucional e do debate público.

This study examines the foundations and meaning of rights to privacy vis-a-vis the government - more particularly, its interests in promoting the security of the population, in terms of reflections and changes caused by technological advances. It aims to defend and demonstrate that the way we face questions about the scope of these rights and the existence or not of violation of them has much to benefit from an interpretive approach - attentive to the nuance given by contexts, which does not flatten the meaning of rights to become equivalente to interests, nor does it presuppose a conflict between privacy and security before deepening the meaning of these values. From there, I offer a model on how to think about privacy rights vis-a-vis the government in this field how to identify them and how to understand what purpose they serve and rescue the meaning of the notion of security and the limits of what it can justify in terms of state measures. This reading reaffirms a central notion for the justification of the use of state force within the interaction between security and privacy: respect for rules and procedures based on collective decisions of a political community that accommodate moral rights against abuses, errors and excesses. These are inspired by commitments of principle that only allow interference with privacy prerogatives when specific concrete reasons justify it - notably individualized suspicion or concrete and imminent danger. These notions are lost when it is simply assumed that public interests outweigh private interests or that a proportionality test would serve to guide state conduct at this intersection. Next, the work presents a historical overview of the constitutional legal protections of privacy in Brazil and reconstructs the case law of the Brazilian Supreme Court (STF) in cases of privacy and how it conceives the limits of the State on the "inviolabilities" of private life, intimacy, domicile and communications secrecy. It shows how understandings were established and how privacy paradigms of the Federal Constitution and constitutional case law align and distance themselves from the thesis presented on what it means to preserve rights to privacy vis-a-vis the government. The diagnosis is that they are largely weakened and disoriented, especially in new areas linked to technological advances, such as telematics secrecy. In view of this, the work shows how the alarmist rhetoric against privacy in the field of fighting crime is fragile, presents a regulatory toolbox to deal with privacy issues and proposes directions for facing concrete issues in the "digital" field, for the identification of limits and for the redirection of constitutional case law and public debate.